Foto: Marcio Silva/ACritica |
No dia 22 de Janeiro de 2012 a ilustríssima membro da falida Academia Amazonense de Letras (diga-se de passagem não produziu nada. Daí a falência da academia.), a mui informada, competente jornalista, formadora de opinião, conhecedora da história do Estado do Amazonas, descendente de alemães - ostentando seus belos olhos azuis, membro de ongs humanitárias, benfeitora dos pobres amazonenses e bajuladora primus causa do governador Omar Aziz (PSD) postou no site Diário do Amazonas, por meio de seu blog, o lindo e magistral artigo sobre a presença expressiva dos hatianos na capital.
Não basta dizer que o texto sofreu um movimento gigantesco nas redes sociais, principalmente no estado, e vários repúdios em incontáveis blogs. O texto era tão bonito de racista! Ela contra os imigrantes e o seu filho baré mora nos EUA!
Diante do besteirol produzido pela colunista social baré representante da hight society amazonense, o articulista Lélio Lauria, através de um dos jornais mais conceituados de Manaus, publicou no dia 24 de janeiro um artigo sobre os problemas dos haitianos e a dívida do estado com os todos os imigrantes. Mas não contente o conhecido e renomado José Ribamar Bessa Freire publicou no Diário do Amazonas, por meio de seu blog "Taqui pra ti", um artigo desconstruindo as visões distorcidas da Mazé Mourão. Logo depois o senador tucano Arthur Virgílio Neto apresentou um artigo menos salgado e mais incisivo a respeito da política externa do país, política esta que leva países mais pobres pensarem um Brasil próspero.
Seguem os artigos para os leitores compararem as diversas opinões sobre a presença haitiano na capital. O primeiro estupidamente escrito é da "imortal" Mazé Mourão, o segundo de Lélio Lauria, o terceiro de José Ribamar Bessa Freire e o quarto do senador Arthur Neto.
Não basta dizer que o texto sofreu um movimento gigantesco nas redes sociais, principalmente no estado, e vários repúdios em incontáveis blogs. O texto era tão bonito de racista! Ela contra os imigrantes e o seu filho baré mora nos EUA!
Mazé Mourão |
Seguem os artigos para os leitores compararem as diversas opinões sobre a presença haitiano na capital. O primeiro estupidamente escrito é da "imortal" Mazé Mourão, o segundo de Lélio Lauria, o terceiro de José Ribamar Bessa Freire e o quarto do senador Arthur Neto.
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O Haiti não é aqui!
O Haiti não é aqui!
Governo Federal autorizou? Pois ‘toma que os filhos são teus’, entende?
Definitivamente, não é no Amazonas. ‘Quem não pode com o pote não pega na rodilha’, já dizia dona Leonor, minha mãe. Se nós não conseguimos diminuir os nossos problemas, que ‘dirá’ de quem chega e toma de assalto esta Manaus de Mil Contrastes! Aliás, a cidade está um verdadeiro contraste de cores, rostos e roupas. Nefredite, minha confiada secretária do lar, fez questão de relembrar um tempo não tão antigo. “Eu cantei a bola ao dizer que, apesar de ainda serem poucos já faziam uma ‘cobrinha’ bem unida e quando o ônibus parava na ‘parada’ do Zumbi 5, esses estrangeiros pulavam em conjunto, antes da gente, e sentavam, tomando todos os bancos. Não sobrava um lugar, credo! Essa turma afro não é igual ao Enen, não. Não vaza nem de com borra!”
Aliás, Nefre também já tinha avisado que eles estão ‘tomando de conta’ até dos empregos nas fábricas do Distrito Industrial dos portadores de necessidades especiais, porque (ela explica!) ‘como não sabem falar a nossa língua, trabalham caladinhos e até passam da hora sem cobrar nada!”
Tirando os exageros de Nefredite, gente, os haitianos além de se espalharem pelos quatro cantos da cidade ainda são abusados. Impediram uma fotógrafa do DIÁRIO DO AMAZONAS de fotografá-los e um outro pediu dinheiro, caso contrário não dava entrevista. Eu posso, dona Zuzu? Concordo com Omar Aziz: tem mais é que se preocupar com os manauaras, ora, ora, ora.
Quando vejo os nossos problemas sociais: crianças amazonenses nos sinais esmolando, monte de pedintes pelos cantos das ruas, mar de camelôs que se forma no centro de Manaus, delegacias lotadas, hospitais sem dar conta de tanto doente, sorry, sorry e sorry, o Haiti definitivamente não é aqui. A pergunta que não quer calar: ‘por que os haitianos não ficam em Tabatinga ou vão povoar outros municípios amazonenses?’. Tenho mais uma que também não cala: ‘Quem ensinou esse caminho de paca, batidinho, batidinho de Manaus para eles, hein?’ Respostas para este blog. Até.
Fonte:
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A questão dos imigrantes haitianos
A questão dos imigrantes haitianos
Nunca é demais lembrar que o Brasil foi construído pelos imigrantes de mais de 20 países, que sempre vieram para o nosso país em busca da realização de um sonho. Temos uma dívida histórica com os imigrantes, que foram os responsáveis pelo crescimento econômico e cultural do país
Para compreender a intricada questão da imigração haitiana no Brasil, faz-se necessário um breve escorço histórico acerca desse tema. Com efeito, o processo migratório no mundo sempre foi marcado por diferentes concepções e políticas de regulamentação estabelecidas de acordo com a conveniência dos governos. Os laços de solidariedade e o acolhimento dos migrantes - que deveriam ser os pontos de maior realce nesse tratamento - foram relegados a um segundo plano, em muitos casos. Nos Estados Unidos os imigrantes, sobretudo os ilegais, sofreram repressão sem precedentes. Os latinos, especialmente os mexicanos, continuam em busca de uma vida melhor em um país mais próspero. O Brasil é o Eldorado, o futuro na visão dos imigrantes.
Muito embora cediço, nunca é demais lembrar que os traços iniciais da imigração no Brasil correspondem ao ano de 1530, com a vinda dos portugueses e o plantio de cana-de-açúcar. Intensificou-se a partir de 1818, quando aqui chegaram os primeiros imigrantes não portugueses, na regência de D. João VI. Depois chegaram os suíços, em 1819, os alemães em seguida e, logo depois, em 1824, os eslavos, os turcos, os árabes, os italianos, os japoneses, e, após a abolição da escravatura, imigrantes de outros países da Europa, todos eles com atuação nos mais variados ramos de negócio. Mais recentemente, e por variados motivos, vieram os coreanos, os chineses e os haitianos. Por paradoxal que possa parecer, vale o registro de que o Brasil é um dos países que abriga número pequeno de refugiados e de imigrantes.
Interessante a atual realidade brasileira: um país que assistiu a seus nacionais procurarem outros países incentiva, agora, a valorização dos imigrantes que nos procuram em busca de melhoria de vida, não propriamente como ocorreu no passado com portugueses, africanos, italianos, alemães, árabes e judeus, mas por outros motivos políticos, sociais e econômicos.
É importante lembrar que o processo migratório do Haiti para o Brasil originou-se após o terremoto que atingiu aquele país, em 12 de janeiro de 2010, e destroçou a vida de mais de três milhões de pessoas, devastando aquele território e deixando um saldo de mais de 200 mil mortos, 300 mil desabrigados e feridos, 100 mil casas destruídas e 83 mil danificadas, fenômeno de imigração em massa só comparado aos êxodos do início do século XX. O fato é que os sobreviventes dessa terrível tragédia tiveram as esperanças destruídas em função da instabilidade política naquele país.
Estima-se que vieram para o Brasil cerca de quatro mil haitianos, em um ano. Alguns gastaram até quatro mil dólares com coiotes e chegaram ao Brasil em situação de vulnerabilidade social, sanitária e de saúde. Na verdade, a migração de haitianos para outras partes do mundo não é recente. Ao longo dos anos, houve emigração para o Caribe, República Dominicana, Estados Unidos, Cuba, México e outros países. Segundo o Itamaraty, essa situação só é comparada, historicamente, à imigração de italianos e japoneses, que aportaram no país ainda no período imperial e nos primeiros anos da República.
A tradição brasileira mostra que sempre mandamos nacionais para fora do país junto com suas famílias, e agora a situação se inverte. Recebemos, no ano de 2005, um total de 25.400 pessoas que viviam no estrangeiro e, no ano de 2010, o número mais que dobrou, com mais de 56 mil estrangeiros. Levantamentos indicam que o número de imigrantes irregulares chega a um milhão de pessoas.
Em certo sentido, a mídia cria uma sensação de que os haitianos estão entrando em massa no nosso país, o que não é verdade, considerando o número de haitianos que migram para outros países.
É necessário destacar que não há caracterização de refúgio para desastres naturais, não sendo o caso de aplicação da Convenção de Genebra, de 1951, ou da Lei n. 9.474 de 22.7.1997, por não estarem comprovados, neste caso, os fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, nem tampouco, a grave e generalizada violação de direitos humanos, fazendo com que os haitianos estivessem obrigados a deixar o seu país para buscar refúgio no Brasil. Há entendimento doutrinário minoritário no sentido de que a instabilidade política no Haiti poderia caracterizar o refúgio, não nos parecendo sustentável essa tese.
Não resta dúvida de que a presença dos haitianos no território brasileiro aumenta a competição junto à população local, considerando que os que vieram para o Brasil são mais qualificados. Nenhuma esfera de governo possui estatísticas sobre em qual ramo a população haitiana imigrante tem vindo trabalhar, nem para quais cidades tem se dirigido após ultrapassar a fronteira e conseguir uma autorização da Polícia Federal, sabendo-se, entretanto que os destinos mais procurados são as capitais do sul e sudeste do país.
Há um temor de que os imigrantes haitianos sejam contratados ilegalmente por empresas, em condições de trabalho escravo, como ocorreu, recentemente, com a marca espanhola Zara, em que foram flagrados estrangeiros em situação análoga à de escravo, em oficinas da empresa, em São Paulo. Para isso, há que se verificar a legalidade da contratação dos haitianos, intensificando-se o acompanhamento e o monitoramento desse trabalho, considerando que imigrantes ilegais são constantemente explorados em outros países com violação de seus direitos trabalhistas.
Temos que destacar as ações do Governo do Amazonas em apoio aos imigrantes haitianos, por meio de vários órgãos, como Cetam, Seduc, Sejus, Susam, Seas, Ministério Público do Trabalho, Sesi, Semed, Semsa, com cursos de qualificação profissional, abertura de vagas no ensino médio, mutirões de saúde, fornecimento de refeições, além do incansável trabalho da Igreja Católica, por meio da Pastoral do Imigrante.
Basta uma simples análise superficial da questão para constatar que os únicos beneficiados com a situação de desespero dos imigrantes haitianos são os coiotes – conhecidos como atravessadores, traficantes, contrabandistas de pessoas. São eles os responsáveis pela vinda ilegal dos haitianos e recebem cerca de três a quatro mil dólares pelo trabalho sujo, consistente de um pacote de viagem vendido facilmente na República Dominicana, com passagens pelo Panamá, Equador e Peru, antes de chegar ao norte do Brasil.
A situação estava fugindo do controle e precisava ser disciplinada, essa foi a justificativa do governo brasileiro para editar a Resolução Normativa nº 97, de 12/01/2012, do Conselho Nacional de Imigração – CNIG, dispondo sobre a concessão do visto permanente, previsto no art. 16, da Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, a nacionais do Haiti, por razões humanitárias, condicionado ao prazo de cinco anos, nos termos do art. 18, da mesma Lei, circunstância que constará da Cédula de Identidade do Estrangeiro. A própria Resolução do CNIG estabelece o que são razões humanitárias, ou seja, aquelas resultantes do agravamento das condições de vida da população haitiana em decorrência do terremoto ocorrido naquele país, em 12 de janeiro de 2010. Ainda de acordo com a Resolução, o visto tem caráter especial e será concedido pelo Ministério das Relações Exteriores, por intermédio da Embaixada do Brasil em Porto Príncipe, com limite de até mil e duzentos vistos por ano, correspondendo a uma média de cem concessões por mês. Antes do término do prazo de cinco anos, o nacional do Haiti deverá comprovar sua situação laboral para fins da convalidação da permanência no Brasil e expedição de nova Cédula de Identidade de Estrangeiro.
De acordo com o Itamaraty, é a primeira vez nos últimos 20 anos que o governo brasileiro decide impor limites à entrega de vistos a estrangeiros. A vinda de haitianos pode ser considerada a maior onda imigratória ao país, em 100 anos. Com efeito, as medidas adotadas na Resolução apresentam quatro grandes finalidades: concessão de visto regular aos imigrantes haitianos; regularização da situação dos imigrantes haitianos que já estão no Brasil; uso de maior rigor contra os coiotes e as máfias internacionais de tráfico de pessoas, com o argumento de que não se permitirá fluxo migratório sem controle e a cooperação com os Estados do Acre e do Amazonas com a ajuda humanística.
Há que se reconhecer que a decisão do governo brasileiro foi pautada pelo aspecto solidário, humanitário, tanto é que as medidas foram respaldadas pelo governo do Haiti e por representantes graduados das Nações Unidas. O governo do Peru já tinha adotado a mesma medida, exigindo visto para os imigrantes haitianos ilegais. O critério adotado para conceder uma média de cem vistos por mês levou em conta o fato de que cerca de 70 a 80 imigrantes haitianos procuravam os órgãos oficiais para regularizar sua situação. O conselho também deverá regularizar a situação de todos os quatro mil imigrantes haitianos que já cruzaram a fronteira. Será exigida, a partir de agora, a condição de ter emprego definido e endereço fixo.
Para efetivar o cumprimento da Resolução do CNIG, há necessidade de aperfeiçoar a fiscalização, especialmente nas fronteiras da Amazônia, o que é tarefa difícil, especialmente a base Garateia, localizada no rio Içá. De acordo com o Ministério da Justiça, em 2011, foram concedidas 1.323 autorizações de residência em caráter humanitário para haitianos
A decisão do Governo brasileiro foi considerada ambígua por alguns especialistas, porque, de um lado permite a entrada, e, do outro, fecha a fronteira. Entretanto, há quem defenda que o fechamento das fronteiras brasileiras ocorreu tardiamente. De qualquer forma, o fato é que a decisão do governo brasileiro provoca, de imediato, a necessidade de aumentar os investimentos de todos os países na reconstrução do Haiti.
A tese de que a migração é um Direito Humano fundamental não afasta a influência do aspecto econômico dessa análise. Não é de estranhar, portanto, que as imigrações sejam muito sensíveis ao panorama econômico mundial. À medida que a economia e as sociedades se internacionalizam, o processo migratório acompanha, fazendo com que tenhamos uma nova realidade migratória no mundo. A diáspora era, antes, para a América do Norte e Europa, principalmente para a França. Hoje, o Brasil é um dos países mais procurados. No governo do Presidente Lula, 45 mil imigrantes ilegais foram anistiados. É possível dizer que a atual política de imigração no Brasil é mais reativa do que no passado. A verdade é que o nosso país impõe uma série de travas aos imigrantes, sejam refugiados ou não. Temos problemas institucionais para tratar essa questão.
De tudo quanto foi exposto, infere-se, necessariamente, que chegou o momento de se discutir uma nova política de imigração. A vinda dos haitianos para o Brasil exige a discussão de uma questão mais ampla, que é a permanência, no país, de estrangeiros em situação irregular. A verdade é que não há definição de quantos haitianos já entraram no país. As estimativas apresentam divergências consideráveis. Parece que tudo é feito na base do improviso e da pressão popular. É preciso aperfeiçoar os institutos jurídicos para que os imigrantes não sofram as mesmas restrições que sofriam no país de origem. A questão mais importante a ser enfrentada é definir a estratégia realmente eficaz a ser adotada pela comunidade internacional, diante do fracasso das ações realizadas na recuperação do Haiti. Não se pode olvidar que o Brasil comanda não só uma força de paz, mas, sobretudo, de recuperação daquele país. O ideal é que não houvesse a imigração, se o trabalho de reconstrução fosse eficaz. Também é importante frisar que o fator preponderante e que efetivamente está reconstruindo o Haiti são as remessas dos refugiados às suas famílias, ou seja, grande parte dos problemas que estamos enfrentando, poderiam ter sido evitados se houvesse no Brasil uma política eficaz em relação aos imigrantes. Não há que se falar em problema de mentalidade dos brasileiros em rejeição aos haitianos, como existe em outros países. Temos que ter cuidado para treinar os nossos agentes para receber os imigrantes, especialmente na questão das línguas que são faladas nos países de origem, além, é claro, da necessidade de difundir junto à população local os valores da solidariedade e o respeito aos imigrantes.
Em suma, a questão tem que ser tratada sob a ótica dos Direitos Humanos, e não do Direito Penal. A questão dos imigrantes haitianos merece ser examinada em todos os aspectos, especialmente o da responsabilidade das três esferas de governo. Sim, não só da União e dos Estados, porque é no município onde os imigrantes têm o primeiro contato com o nosso país.
Nunca é demais lembrar que o Brasil foi construído pelos imigrantes de mais de 20 países, que sempre vieram para o nosso país em busca da realização de um sonho. Hoje não pode ser diferente, considerando que já somos a 6ª economia do mundo. Todos nós temos uma história de imigrante em nossa família. Temos uma dívida histórica com os imigrantes, que foram os responsáveis pelo crescimento econômico e cultural do país.
Enfim, o Haiti não é aqui, é?
***
Ai de ti, Haiti!
Ai de ti, Haiti!
“Se o mundo é um vale de lágrimas, o Haiti é, certamente,
o cantinho mais irrigado desse vale.” (René Depestre)
Eles fizeram uma longa fila e foram embarcando, um a um, no navio chamado “O Sagrado Coração”, que zarpou de Tabatinga (AM) para Manaus neste sábado, 21 de janeiro. Os passageiros não sabiam direito de quem era aquele coração que os conduziria: de Jesus ou de Maria? O nome genérico não diz, mas eles logo perceberam que era de Maria. Só um coração sangrado de mãe – onde sempre cabe mais um – poderia abrigar mais de 400 haitianos com tantos sonhos, sofrimentos, dor, medo.
O medo dentro do barco-coração que descia o rio Solimões era “o medo da fatalidade que sempre acompanhou o Haiti”. Quem diz isso é um amigo chileno, Fred Spinoza, professor de espanhol em Tabatinga, que testemunhou a passagem dramática dos haitianos, ameaçados de se tornarem um boat people – refugiados que ninguém quer receber e que, sem chão onde pisar, transformam o barco em sua nova pátria.
Fred, poeta como qualquer chileno – todo chileno verseja – me enviou trechos do Navio Negreiro de Castro Alves para ilustrar o cenário daqueles haitianos amontoados em redes armadas umas sobre as outras. No domingo passado, ele me cantou o roteiro do barco: “O Sagrado Coração, que saiu ontem daqui, deve passar hoje por Fonte Boa, amanhã por Coari e chegar no Roadway, em Manaus,na terça, dia 24”. Manifestou preocupação quanto à recepção aos hermanos haitianos em Manaus.
Sangrado Coração
Manaus já nasceu de um parto sangrento, filha de um crime e de um roubo, cometidos em 1669 por militares portugueses. Tropas armadas invadiram e saquearam as aldeias indígenas, mataram muitos índios, escravizaram outros e usurparam suas terras. Seu comandante, Francisco da Mota Falcão, construiu bem em cima de um cemitério indígena o Forte de São José do Rio Negro, usando a mão de obra de índios escravizados e, como matéria prima, o barro das urnas funerárias quebradas e violadas. Quem pariu Manaus foi a pilhagem colonial.
Por isso, talvez, Manaus sabe ser impiedosa, cruel. Mas sabe também ser generosa, como mostra sua história posterior. Muitas vítimas do terremoto de Lisboa, de 1755, foram acolhidas pela cidade já mestiça, que lhes deu teto, trabalho, comida. Na época da borracha, entre 1877 e 1914, mais de 500 mil nordestinos, fugindo da seca, entraram na Amazônia, muitos deles armaram suas redes em Manaus. Com eles chegaram sírios, libaneses, espanhóis, judeus, turcos, árabes, japoneses, espanhóis e uma nova leva pacífica de portugueses.
Dessa forma, a cidade foi se construindo sobre os alicerces da diversidade, com trabalho, sangue e suor dos estrangeiros que, vindos de fora, souberam muito bem se integrar àquela sociedade de base índia. Era tudo gente de paz. Como o portuga José Ventura – o Comandante Ventura – que em 1961 morreu para nos salvar. Ele chegou em 1919. Três décadas depois criou o Corpo de Bombeiros Voluntários de Manaus. Faleceu quando combatia um grande incêndio que consumia a periferia da cidade, como lembra pesquisa histórica realizada por Roberto Mendonça.
Outro portuga que ama a cidade e ajudou a construí-la é o dono do bar da Bica, o Armando, o mais caboco de todos os portugas, que está nesse momento, aos 75 anos, numa UTI de um hospital manauara. Armando e o comandante Ventura, que migraram por razões econômicas, fizeram mais por Manaus do que o belicoso Francisco da Mota Falcão, Pedro Teixeira e todo o exército colonial.
Água no Feijão
Os haitianos que chegaram agora vieram em missão de paz, de trabalho, mas foram recebidos à bala. O governador do Amazonas, Omar Aziz (PSD), filho de um imigrante palestino que se mudou para Manaus em 1968, debochou, sugerindo que o governo federal os abrigasse em Brasília, “em apartamentos de deputados federais”, conforme matéria publicada pela Folha de São Paulo assinada pela correspondente Kátia Brasil.
Pra puxar o saco do governador, a colunista social Mazé Mourão atacou os haitianos, chamando-os de “abusados”. Num texto boçal e preconceituoso, ela reclama que eles estão tomando conta dos empregos nas fábricas do Distrito Industrial e “como não sabem falar a nossa língua, trabalham caladinhos e até passam da hora sem cobrar nada”. Preocupada exclusivamente com o quintal de sua casa, sugere: “Por que os haitianos não ficam em Tabatinga ou vão povoar outros municípios do Amazonas?”.
Que me perdoem os ouvidos pudibundos, mas esse é o lado escroto de Manaus, o lado “farinha pouca meu pirão primeiro”. Felizmente, o outro lado, generoso e solidário, o lado “água no feijão que chegou mais um” se manifestou imediatamente. Dezenas de leitores ocuparam as redes sociais apoiando artigos de Alberto Jorge Silva, Allan Gomes e Ismael Benigno que se solidarizaram com os haitianos e lhes deram as boas-vindas.
Se a colunista social não pedir desculpas, publicamente, nós, os que ficamos chocados com seu texto, acamparemos com os haitianos o quintal da casa dela. Faremos um trabalho de magia negra para transformá-la em um ser inteligente, sensível e solidário. Se bem que suspeito não existir magia capaz de dar jeito nisso. Mas a gente tenta.
o cantinho mais irrigado desse vale.” (René Depestre)
Eles fizeram uma longa fila e foram embarcando, um a um, no navio chamado “O Sagrado Coração”, que zarpou de Tabatinga (AM) para Manaus neste sábado, 21 de janeiro. Os passageiros não sabiam direito de quem era aquele coração que os conduziria: de Jesus ou de Maria? O nome genérico não diz, mas eles logo perceberam que era de Maria. Só um coração sangrado de mãe – onde sempre cabe mais um – poderia abrigar mais de 400 haitianos com tantos sonhos, sofrimentos, dor, medo.
O medo dentro do barco-coração que descia o rio Solimões era “o medo da fatalidade que sempre acompanhou o Haiti”. Quem diz isso é um amigo chileno, Fred Spinoza, professor de espanhol em Tabatinga, que testemunhou a passagem dramática dos haitianos, ameaçados de se tornarem um boat people – refugiados que ninguém quer receber e que, sem chão onde pisar, transformam o barco em sua nova pátria.
Fred, poeta como qualquer chileno – todo chileno verseja – me enviou trechos do Navio Negreiro de Castro Alves para ilustrar o cenário daqueles haitianos amontoados em redes armadas umas sobre as outras. No domingo passado, ele me cantou o roteiro do barco: “O Sagrado Coração, que saiu ontem daqui, deve passar hoje por Fonte Boa, amanhã por Coari e chegar no Roadway, em Manaus,na terça, dia 24”. Manifestou preocupação quanto à recepção aos hermanos haitianos em Manaus.
Sangrado Coração
Manaus já nasceu de um parto sangrento, filha de um crime e de um roubo, cometidos em 1669 por militares portugueses. Tropas armadas invadiram e saquearam as aldeias indígenas, mataram muitos índios, escravizaram outros e usurparam suas terras. Seu comandante, Francisco da Mota Falcão, construiu bem em cima de um cemitério indígena o Forte de São José do Rio Negro, usando a mão de obra de índios escravizados e, como matéria prima, o barro das urnas funerárias quebradas e violadas. Quem pariu Manaus foi a pilhagem colonial.
Por isso, talvez, Manaus sabe ser impiedosa, cruel. Mas sabe também ser generosa, como mostra sua história posterior. Muitas vítimas do terremoto de Lisboa, de 1755, foram acolhidas pela cidade já mestiça, que lhes deu teto, trabalho, comida. Na época da borracha, entre 1877 e 1914, mais de 500 mil nordestinos, fugindo da seca, entraram na Amazônia, muitos deles armaram suas redes em Manaus. Com eles chegaram sírios, libaneses, espanhóis, judeus, turcos, árabes, japoneses, espanhóis e uma nova leva pacífica de portugueses.
Dessa forma, a cidade foi se construindo sobre os alicerces da diversidade, com trabalho, sangue e suor dos estrangeiros que, vindos de fora, souberam muito bem se integrar àquela sociedade de base índia. Era tudo gente de paz. Como o portuga José Ventura – o Comandante Ventura – que em 1961 morreu para nos salvar. Ele chegou em 1919. Três décadas depois criou o Corpo de Bombeiros Voluntários de Manaus. Faleceu quando combatia um grande incêndio que consumia a periferia da cidade, como lembra pesquisa histórica realizada por Roberto Mendonça.
Outro portuga que ama a cidade e ajudou a construí-la é o dono do bar da Bica, o Armando, o mais caboco de todos os portugas, que está nesse momento, aos 75 anos, numa UTI de um hospital manauara. Armando e o comandante Ventura, que migraram por razões econômicas, fizeram mais por Manaus do que o belicoso Francisco da Mota Falcão, Pedro Teixeira e todo o exército colonial.
Água no Feijão
Os haitianos que chegaram agora vieram em missão de paz, de trabalho, mas foram recebidos à bala. O governador do Amazonas, Omar Aziz (PSD), filho de um imigrante palestino que se mudou para Manaus em 1968, debochou, sugerindo que o governo federal os abrigasse em Brasília, “em apartamentos de deputados federais”, conforme matéria publicada pela Folha de São Paulo assinada pela correspondente Kátia Brasil.
Pra puxar o saco do governador, a colunista social Mazé Mourão atacou os haitianos, chamando-os de “abusados”. Num texto boçal e preconceituoso, ela reclama que eles estão tomando conta dos empregos nas fábricas do Distrito Industrial e “como não sabem falar a nossa língua, trabalham caladinhos e até passam da hora sem cobrar nada”. Preocupada exclusivamente com o quintal de sua casa, sugere: “Por que os haitianos não ficam em Tabatinga ou vão povoar outros municípios do Amazonas?”.
Que me perdoem os ouvidos pudibundos, mas esse é o lado escroto de Manaus, o lado “farinha pouca meu pirão primeiro”. Felizmente, o outro lado, generoso e solidário, o lado “água no feijão que chegou mais um” se manifestou imediatamente. Dezenas de leitores ocuparam as redes sociais apoiando artigos de Alberto Jorge Silva, Allan Gomes e Ismael Benigno que se solidarizaram com os haitianos e lhes deram as boas-vindas.
Se a colunista social não pedir desculpas, publicamente, nós, os que ficamos chocados com seu texto, acamparemos com os haitianos o quintal da casa dela. Faremos um trabalho de magia negra para transformá-la em um ser inteligente, sensível e solidário. Se bem que suspeito não existir magia capaz de dar jeito nisso. Mas a gente tenta.
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29 de Janeiro de 2012
Os haitianos são uma realidade aqui e agora. Resgatá-los é um dever humanitário
ARTHUR VIRGÍLIO
Os haitianos são uma realidade aqui e agora. Resgatá-los é um dever humanitário
ARTHUR VIRGÍLIO
O Amazonas assiste, não sem surpresa, à imigração maciça de haitianos. A Pastoral do Imigrante da Igreja Católica, solidária, exauriu as precárias condições de atendimento na igreja e comunidade de São Geraldo. É preciso encontrar uma solução humanitária e prática, urgente e justa, para evitar um problema maior. É preciso ir ao X da questão.
O Haiti é hoje um país sem governo e sem estrutura. Os militares brasileiros estão lá, à frente das tropas da ONU, na Mission des Nations Unies pour la stabilisation en Haïti (em francês, Minustah - Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti). Tentam, sob o comando do General Floriano Peixoto Vieira Neto, manter a ordem e combater os focos cada vez maiores de violência.
O Brasil foi escolhido para comandar essas tropas por ter o maior contingente e porque o governo, nos idos de 2004, já buscava cacife para pleitear uma vaga no Conselho de Segurança da ONU. Em 19 de agosto de 2004, início da Minustah, a Seleção Brasileira foi levada a Porto Príncipe e venceu a Haitiana por 6 a 0.
O governo fez de tudo para vender uma imagem do Brasil como Terra da Promissão. Esqueceu ter sido incapaz de resolver o abandono da gente do Alto Solimões, a porta escancarada por onde circula o narcotráfico. Fingiu não ver a miséria grassando na periferia de Manaus. Os haitianos, após os desastres do governo de Jean-Bertrand Aristide e do terremoto de janeiro de 2010, acreditaram piamente que as coisas por aqui são das mil e uma noites.
Foi assim que os habitantes da pequena ilha, insulada entre a República Dominicana e Cuba, passando pelo Mar do Caribe e vários países, desembarcaram em Tabatinga (AM). Lá, neste momento, cerca de 2 mil deles se engalfinham com caboclos e índios em busca da sobrevivência. Mais de 4 mil já estão em Manaus.
O Brasil precisa ser responsável com essa imigração. Os haitianos têm se mostrado dóceis, pacíficos, trabalhadores. Mas não podemos ignorar os lugares que percorreram, o sofrimento que vêm enfrentando, a brutalidade a que são submetidos - os biombos de paredes nuas onde moram e a onda de violência que os cerca, numa periferia onde não é incomum a cobrança de pedágio para atravessar uma ponte ou cruzar uma viela.
Nunca antes neste país estivemos tão próximos de perder a guerra por nossos jovens para o tráfico e a violência. Nunca antes neste país se ouviu tanto falar de jovens, meninos e meninas, de 16, 17 anos, integrando e até chefiando quadrilhas de roubo, sequestro relâmpago e homicídios.
Estamos travando uma nova guerra, agora pela mão de obra dos haitianos, sem parecer nos dar conta disso.
O Governo Federal cruza os braços e manda avisar que, "dia 2 de fevereiro, enviará funcionários a Manaus". Parece esquecido de que hoje existe o avião comercial a jato ou mesmo o AeroLula, capazes de cortar a distância Brasília-Manaus em menos de três horas.
Os brasileiros, menos ainda os amazonenses, não são capazes de negar solidariedade. Os haitianos são uma realidade aqui e agora. Resgatá-los é um dever humanitário, que precisa, porém, ser compatibilizado com o amplo resgate de nossos jovens. Chega de o Governo Federal nos virar as costas em momentos decisivos.
O Haiti é hoje um país sem governo e sem estrutura. Os militares brasileiros estão lá, à frente das tropas da ONU, na Mission des Nations Unies pour la stabilisation en Haïti (em francês, Minustah - Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti). Tentam, sob o comando do General Floriano Peixoto Vieira Neto, manter a ordem e combater os focos cada vez maiores de violência.
O Brasil foi escolhido para comandar essas tropas por ter o maior contingente e porque o governo, nos idos de 2004, já buscava cacife para pleitear uma vaga no Conselho de Segurança da ONU. Em 19 de agosto de 2004, início da Minustah, a Seleção Brasileira foi levada a Porto Príncipe e venceu a Haitiana por 6 a 0.
O governo fez de tudo para vender uma imagem do Brasil como Terra da Promissão. Esqueceu ter sido incapaz de resolver o abandono da gente do Alto Solimões, a porta escancarada por onde circula o narcotráfico. Fingiu não ver a miséria grassando na periferia de Manaus. Os haitianos, após os desastres do governo de Jean-Bertrand Aristide e do terremoto de janeiro de 2010, acreditaram piamente que as coisas por aqui são das mil e uma noites.
Foi assim que os habitantes da pequena ilha, insulada entre a República Dominicana e Cuba, passando pelo Mar do Caribe e vários países, desembarcaram em Tabatinga (AM). Lá, neste momento, cerca de 2 mil deles se engalfinham com caboclos e índios em busca da sobrevivência. Mais de 4 mil já estão em Manaus.
O Brasil precisa ser responsável com essa imigração. Os haitianos têm se mostrado dóceis, pacíficos, trabalhadores. Mas não podemos ignorar os lugares que percorreram, o sofrimento que vêm enfrentando, a brutalidade a que são submetidos - os biombos de paredes nuas onde moram e a onda de violência que os cerca, numa periferia onde não é incomum a cobrança de pedágio para atravessar uma ponte ou cruzar uma viela.
Nunca antes neste país estivemos tão próximos de perder a guerra por nossos jovens para o tráfico e a violência. Nunca antes neste país se ouviu tanto falar de jovens, meninos e meninas, de 16, 17 anos, integrando e até chefiando quadrilhas de roubo, sequestro relâmpago e homicídios.
Estamos travando uma nova guerra, agora pela mão de obra dos haitianos, sem parecer nos dar conta disso.
O Governo Federal cruza os braços e manda avisar que, "dia 2 de fevereiro, enviará funcionários a Manaus". Parece esquecido de que hoje existe o avião comercial a jato ou mesmo o AeroLula, capazes de cortar a distância Brasília-Manaus em menos de três horas.
Os brasileiros, menos ainda os amazonenses, não são capazes de negar solidariedade. Os haitianos são uma realidade aqui e agora. Resgatá-los é um dever humanitário, que precisa, porém, ser compatibilizado com o amplo resgate de nossos jovens. Chega de o Governo Federal nos virar as costas em momentos decisivos.
*Diplomata
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O Estado do Amazonas possui dívida de longo prazo com os imigrantes, dos quais este blogueiro é um descendente. E com estes textos podemos tirar mais conclusões.
não sei o que vc faz puxando o saco de um cara corno, que vive no ostracismo e mora em niteroi.
ResponderExcluirCaro anônimo,
ResponderExcluirsão bem-vindos comentários. Até defender uma socialyte borra-botas que faz de tudo para ser aceita e esquecer seus traços indígenas.
Senhor Samuel Cavalcante: Por primeiro, sou anti racista, filho de emigrantes, mas brasileiro nato e não me deixando levar por pieguices; por segundo, o Haiti era um local próspero até que negros assumiram o govêrno disseminando pobreza, miséria, doenças, crime, bruxaria e injustiças. Não se há de esquecer que a África é um continente onde também prosperam tais horrores de negros matando negros dia e noite, até por diferenças religiosas, sem deixar de lembrar da antropofagia ainda lá praticada, inclusive a escravatura. Dirá o senhor o que tem a haver alho com bimbalho, ao que respondo, tudo! Esse pessoal do Haiti não consegue viver em paz um com o outro, e querem trazer para cá costumes e hábitos, inclusive de voduismo, bandidagem e criminalidade. Não diga que não sei o que afirmo, pois quando ainda na capital São Paulo via bem o que africanos faziam no bairros onde se instalavam (inclusive sendo grandes traficantes e vendedores de drogas) e que certamente seus conterrâneos do Haiti o farão aqui no Brasil. Concordo com a colunista, ainda, de que fechemos nossas fronteiras para a entrada de estrangeiros.
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